[LIVROS] Jane Austen: Conheça a mulher por trás dos clássicos romances

[LIVROS] Jane Austen: Conheça a mulher por trás dos clássicos romances

Há quem julgue os famosos romances de Jane Austen, quase todos envolvidos por uma atmosfera de romance bucólico. Há quem desmereça os livros escritos por esta autora classificando-os como antigos romances sem grande relevância para a sociedade moderna. O que, porém, se esconde por trás destes romances, é uma grande força e relevância da figura feminina.

Não se pode negar que os romances de Austen bem caracterizem a sociedade de seu tempo. Os costumes de uma Inglaterra do início do século XIX estarão certamente em suas páginas, muito embora a autora se atenha à simplicidade de uma vida afastada da capital. Por meio de uma narrativa sem eventos extraordinários, guerras ou experiências controversas de uma vida urbana, Jane Austen retrata, sobretudo, o cotidiano de mulheres da sociedade britânica campestre. E ainda que suas personagens não constituam verdadeiras quebras de paradigma, sutilmente ultrapassam as barreiras das convenções estabelecidas, opondo-se a homens e mulheres conforme suas crenças.

O cenário de suas ficções é uma sociedade rígida quanto ao papel da mulher. Suas vidas são reduzidas aos cuidados familiares e ao desejo de casamento. Porém, mesmo dentro destas condições, Austen conseguiu recriar o papel da mulher através de suas protagonistas.

elizabeth-bennetNa mais famosa de suas obras, “Orgulho e Preconceito”, Austen apresenta a heroína Elizabeth Bennet. É de se concordar que a personagem influenciou e influencia até hoje pessoas que possuam alguma espécie de contato com as histórias da autora, seja através de seus livros ou das inúmeras adaptações e releituras a partir deles originadas. Elizabeth cativa por sua personalidade destoante. Sua família tem na aparência o desejo pelo que é socialmente valorizado, mas apresenta em sua essência pequenas rupturas em relação aos costumes, como é visto na criação das cinco filhas. Elizabeth é amante do conhecimento, o que a destaca quando em comparação aos demais personagens. Um tanto cética, deseja um casamento, mas não deseja qualquer casamento apenas pelo status. É descrita como arrogante e determinada, o que move sua história com o fechado Mr. Darcy. Não esconde em sua trajetória o quanto erra por equivocados julgamentos, mas não se deixa dominar pelo julgamento alheio. Austen deixa claro que Elizabeth é dotada de voz própria.

marianne-dashwoodTalvez as personagens Dashwood, de “Razão e Sensibilidade”, não possuam características tão marcantes quanto a protagonista de “Orgulho e Preconceito”. Ainda assim contribuem de certo modo para a quebra da idealização da mulher. Marianne Dashwood é movida pelos sentimentos, enquanto Elinor é movida pelo raciocínio. No começo da história, Marianne contraria a todos ao seguir apenas suas paixões. Mas no final, uma inversão ocorre, demonstrando que não há quem seja movido apenas pela razão ou apenas pela sensibilidade. Então chega o momento da conservadora Elinor, tão adepta das regras sociais, ignorar julgamentos e viver sua vida independentemente do que racionalmente – moralmente – se dizia correto.

anne-elliotEm um dos últimos romances da autora, “Persuasão”, a protagonista é Anne Elliot, talvez a mais madura de suas personagens. Anne Elliot nunca se casou. Os críticos podem afirmar que este fato se dá em função do mito do amor verdadeiro e da preservação da pureza da mulher para aquele. Ainda assim, Anne Elliot demonstra força e vontade própria ao recusar qualquer casamento que não seja em virtude de seus sentimentos, mesmo que venha a ser julgada posteriormente por sua idade e seu status de solteira. Opõe-se, então, uma sociedade que exige que a mulher ainda jovem seja objeto de afeição de um homem e aceite este papel e uma personagem que se recusa a interpretar este papel senão por sua própria vontade. Estas exigências não estão muito longe das da sociedade contemporânea, revelando que os livros de Austen ainda possuem relevância.

As personagens de Jane Austen contêm parcelas da personalidade e da vida da própria autora. Austen foi uma das poucas mulheres a serem reconhecidas em sua época pelo seu trabalho com a escrita, algo bastante relevante para a trajetória feminina. Se analisadas as listas de clássicos, o número de livros escritos por homens é consideravelmente maior que o de mulheres. Neste sentido, é importante valorizar as obras da autora. Ainda que seus livros não contenham histórias vanguardistas, ela conseguiu algo que muitas mulheres não conseguiram: não passar despercebida. Austen foi eternizada.

jane-austen-silhouetteNão só isto, contudo. Austen foi uma mulher que nunca se casou.Os motivos misturam sua personalidade, sua vontade e também sua condição financeira. Ainda assim, as biografias apontam que Austen não era movida somente pelas convenções sociais, muitas vez ignorando-as.

A liberdade feminina requer a quebra do romantismo. Isto não significa retirar das vidas femininas a ideia do amor – ou histórias sobre o amor –, mas quebrar a ideia romântica da mulher, uma idealização baseada no conservadorismo. Ainda que os romances de Austen não representem esta verdadeira e completa quebra, apresentam elementos que devem ser considerados e valorizados. Mais do que valorizá-los, porém, é preciso valorizá-la. Austen foi uma mulher independente, que nunca se casou, que sempre prezou o seu trabalho, que conseguiu prestígio em uma sociedade conservadora e machista, apresentando personagens que, dentro do possível, demonstraram uma força inovadora. Emma, Fanny, Susan, Elizabeth, Marianne, Elinor, Anne, mesmo a romântica Catherine de “A Abadia de Northanger” e as demais personagens concentram a força feminina que Jane Austen pode transmitir às gerações posteriores.

“Era o fim das visões romanceadas. Catherine estava completamente desperta. As palavras de Henry, embora breves, abriram-lhe mais efetivamente os olhos para a extravagância de suas recentes fantasias do que todas as várias decepções.” (A Abadia de Northanger)

 

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Mestra em Teoria e História do Direito e redatora de conteúdo jurídico. Escritora de gaveta. Feminista. Sarcástica por natureza. Crítica por educação. Amante de livros, filmes, séries e tudo o que possa ser convertido em uma grande análise e reflexão.
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