Mulheres Negras no Rock: de Lisa Fischer ao Rock Alternativo dos Anos 90

Mulheres Negras no Rock: de Lisa Fischer ao Rock Alternativo dos Anos 90

A década de 1990 talvez tenha sido a última grande década para o rock, que foi perdendo espaço nas décadas seguintes para o pop, música eletrônica e seus derivados. Essa foi a década em que o grunge e o rock alternativo dominaram, junto com o britpop, que ganhou espaço com bandas como Oasis e Blur, assim como bandas de hard rock que retomaram o sucesso de suas carreiras das décadas anteriores, como o Aerosmith. Mas quem eram as mulheres negras que faziam rock nessa década?

Neste texto vamos destacar a carreira de Lisa Fischer, conhecida pelos vocais poderosos e pelas participações com os Rolling Stones. Também falaremos de Deborah Dyer, mais conhecida como Skin, vocalista do Skunk Anansie. E ainda teremos Lisa Kekaulalíder da banda de garage punk Bellrays. E para finalizar, temos Yvonne Ducksworth e a sua banda punk Jingo De Lunch.

OS VOCAIS PODEROSOS DE LISA FISCHER

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Lisa Fischer nasceu em 1º de dezembro de 1958, na cidade de Nova Iorque. Além de cantora, também é compositora e guitarrista. Fischer iniciou a sua carreira em 1983 com o nome artístico de “Xena”, mas migrou para os backings vocals ao longo dos anos, trabalhando com artistas como Tina Turner, Patti Labelle, Sting e Luther Vandross. Em 1991 ela recebeu um Prêmio Grammy, de Melhor Performance Feminina de R&B, por sua canção “How Can I Ease the Pain“, fruto do trabalho “So Intense”, único álbum de sua carreira solo.

Mesmo tendo talento de sobra para cantar ritmos como soul, jazz, rock, gospel, pop, folk e música clássica, Lisa preferiu acompanhar outros artistas no palco e em 1989 entrou para os vocais de apoio dos Rolling Stones.

A cantora fez história com as suas performances memoráveis junto com Mick Jagger, em especial na música “Gimme Shelter” em que ela substitui Merry Clayton, a voz original da gravação em estúdio, e honra a cantora de soul. Até hoje Lisa Fischer é lembrada por suas participações no palco com os Stones.

“Toda vez que Lisa Fischer pisa no palco para cantar com os Rolling Stones, uma chama de excitação dança em volta dela. ‘Cada um têm uma energia diferente, como a diferença entre pimenta caiena e jalapeño… é tudo quente para mim.’ Ela está em casa, está nervosa, está pronta para o que acontecer depois, e não há nenhum outro lugar no mundo em que ela prefira estar.”

– via rollingstones.com

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Lisa Fischer e Mick Jagger (Reprodução)

Além dos britânicos, Lisa também excursionou com o Nine Inch Nails e tem uma legião de fãs fiéis. Ela conseguiu balancear a sua carreira solo com os vocais de apoio para outras bandas e é querida e venerada no meio artístico.

Ela nunca perseguiu a fama e cantar sempre foi o seu foco principal, seja como apoio para os Rolling Stones ou sozinha. Em 2013 ela participou do documentário vencedor do Oscar: Twenty Feet from Stardom que, além de Lisa Fischer, mostra outras backing singers notáveis como Merry Clayton, Darlene Love, Judith Hill e Claudia Lennear.

Atualmente Lisa Fischer está excursionando com a sua banda Grand Baton pela primeira vez em sua carreira, cantando uma mistura de rock progressivo, soul, ritmos africanos e influências clássicas, junto com os clássicos do rock que a consagraram.

 

SKIN E O SKUNK ANANSIE: ATIVISMO E ROCK ALTERNATIVO

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Skunk Anansie (Reprodução)

O Skunk Anansie é uma banda de rock alternativo liderada por Deborah Dyer, conhecida como “Skin“. O grupo foi formado em Londres em 1994 e integra a cena de britrock da época, além de Skin nos vocais o grupo também é formado por Ace na guitarra, Cass no baixo e Mark na bateria.

Ao todo eles lançaram três álbuns nos anos 1990: Paranoid and Sunburnt (1995), Stoosh (1996) e Post Orgasmic Chill (1999). No começo dos anos 2000 o grupo se separou e só retomou as atividades em 2009, lançando mais quatro álbuns: Smashes and Trashes (2009), Wonderlustre (2010), Black Traffic (2012), Anarchytecture (2016).

O grupo vendeu mais de 4 milhões de discos e se destacou por trazer uma mulher negra nos vocais fazendo um som político e pesado. A banda é mais conhecida por fazer sucesso na Europa, com hits como Weak, Hedonism e Charlie Big Potato. O Skunk Anansie é uma das maiores bandas britânicas da época e Skin é uma das poucas mulheres negras na cena do rock alternativo da década.

Deborah Anne Dyer nasceu em 3 de agosto de 1967 em Londres. O nome Skin veio de um apelido de infância encurtado, “Skinny” – ela era uma garota muito magra e o apelido acabou virando “Skin” quando ela formou a banda.

Skin conheceu na sua infância nomes como Bobby Marley e Mohamad Ali. Filha de pais jamaicanos, o seu avô era dono de um shebeen (um tipo de bar que acolhia pessoas negras que não eram aceitas em outros clubes noturnos da época) em Londres e foi lá que ela teve o seu primeiro contato com a música:

“Quando eu era criança, pessoas como Cassius Clay antes de ser Muhammad Ali costumavam ir ao clube do meu avô. Assim como Bob Marley e Peter Tosh.”

– Skin no fusion.kinja.com

Skin já se declarou como ativista e as questões raciais estão sempre presentes em seu trabalho, como na música “Intellectualise My Blackness”. A cantora sempre se achou mais jamaicana do que britânica e quando foi para a jamaica percebeu que não sabia quem ela era na verdade, só que era negra.

Skin também é formada em arquitetura, mas a sua paixão sempre foi a música. Na adolescência conheceu o ska e, depois de uma tentativa frustrada de montar uma banda, conseguiu formar o Skunk Anansie.

O seu visual marcante de cabeça raspada se tornou a sua marca registrada e além de cantora, Skin também é modelo, DJ, atriz e ativista. Depois que a sua banda se separou em 2001 ela seguiu em carreira solo, lançando dois álbuns: Fleshwounds (2003) e Fake Chemical State (2006). Atualmente ela segue fazendo shows com o Skunk Anansie.

“Sou uma mulher, também sou negra. Também sou gay, bissexual, tenho sexualidade fluida. Eu também sou de uma origem muito pobre – essas quatro coisas realmente criaram meu caráter e a minha identidade.”

LISA KEKAULA: THE BELLRAYS E A SUA MISTURA DE PUNK E SOUL

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Lisa Kekaula e o BellRays (Reprodução)

O BellRays foi formado no começo da década de 1990 quando Lisa Kekaula se juntou ao guitarrista Bob Venuum e formaram a banda de garage rock que mistura elementos do punk e do soul com o vozeirão de Kekaula.

Lisa nasceu na Califórnia em 31 de julho de 1967, filha de mãe negra e pai havaiano. Ela tem uma carreira sólida na cena alternativa e é casada com Bob Venuum. Ela já trabalhou com o ex-guitarrista do Stooges e gravou duas faixas na regravação do álbum Re-Licked, do Iggy and the Stooges.

O primeiro trabalho do grupo foi In the Light of the Sun (1992), gravado em cassette e remasterizado em 2002, Let It Blast (1998) foi o álbum que marcou a sonoridade e pisada forte da banda e traz músicas como “Changing Colors”‘ e “Black Honey”, mas na verdade o álbum inteiro é bom.

Kekaula comanda o BellRays com a sua voz poderosa e uma atitude no palco marcante e apesar de todo o seu talento ela não se importa em fazer sucesso no mainstream. A música é sempre o foco principal do seu trabalho. Talvez por isso o BellRays seja tão bom e tão desconhecido.

“Nós nunca fomos uma banda que vendeu muitos discos. (…) Há todas essas outras bandas que estão tentando alcançar esses outros objetivos – não me importo com o que as outras bandas querem fazer, eu só quero tocar música”.

– Lisa Kekaula no smh.com

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Lisa Kekaula (Reprodução)

Algumas pessoas comparam a voz de Kekaula com Janis Joplin, mas como já aprendemos aqui o rock tem as suas representantes negras poderosas, que deixam Joplin no fim da lista de comparações. A vocalista do Bellrays traz as suas raízes do soul para o rock e cria uma mistura maravilhosa, provando que o rock também é das mulheres negras.

Ao todo a banda tem oito álbuns lançados: In the Light of the Sun (1992), Let It Blast (1998), Punk Rock and Soul (1999), Grand Fury (2000), The Red, White and Black (2004), Have A Little Faith (2006), Hard Sweet and Sticky (2008) e Black Lightning (2010). E segue firme e forte fazendo shows por aí, inclusive aqui no Brasil, por onde a banda já passou algumas vezes.

YVONNE DUCKSWORTH E O SEU JINGO DE LUNCH

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Yvonne Ducksworth (Reprodução)

Yvonne Ducksworth nasceu no Canadá em 1967 e ainda adolescente se mudou para a Alemanha com a sua família. Em 1987 formou a banda punk Jingo De Lunch, junto com Steve Hahn na bateria, Henning Menke no baixo, Tom Schwoll e Sepp Ehrensberger na guitarra. No final da década de 1980 eles gravaram dois discos: Perpetuum Mobile (1987) e Axe To Grind (1989) e ficaram conhecidos na Alemanha.

Nos anos 1990 o grupo gravou mais três álbuns: Underdog (1990), B.Y.E (1991) e Deja Voodoo (1994), mas acabou se separando em 1996 e só retornou a atividade dez anos depois lançando mais três trabalhos: The Independent Years (2007), Land of the Free-ks (2010) e Live in Kreuzberg (2011), se separando novamente em 2012.

O som do Jingo De Lunch mesclava elementos do punk, hardcore, hard rock e rock. Após a gravação dos seus dois primeiros discos eles assinaram contrato com uma grande gravadora e saíram em turnê pela Europa, chegando a tocar com bandas como os Ramones, Bad Brains e Bad ReligionAlém de cantora, Ducksworth também é atriz e apresentadora e atuou em vários filmes na década 1990. Ela também é ativista pelos direitos do animais.

“Eu simplesmente não consigo ficar de boca fechada. Eu não vou ficar parada e concordar em ser abusada! Outras gerações de pessoas negras tiveram que fazer isso para sobreviver, mas seria um grande erro ao meu ver desonrá-las agora fechando a boca e ficando calada!”

– Yvonne Ducksworth no noisecreep.com

Ouça a playlist especial Mulheres Negras no Rock:

Fontes:

Texto originalmente publicado em Sopa Alternativa.

Escrito por:

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Formada em artes visuais e apaixonada por arte, música, livros e HQs. Atualmente pesquisa sobre mulheres negras no rock. Seu site é o Sopa Alternativa.
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