Nico, 1988: poderosa biografia da cantora ícone do Velvet Underground

Nico, 1988: poderosa biografia da cantora ícone do Velvet Underground

A diretora italiana Susanna Nicchiarelli sempre teve fascínio pela voz andrógina e misteriosa de Nico, cantora que gravou os vocais do primeiro disco da banda Velvet Underground. Após pesquisar mais a fundo sua carreira, Susanna descobriu que Nico teve um período solo posterior bastante frutífero e pouco conhecido. Tudo o que a mídia mencionava sobre ela era sua colaboração com Andy Warhol nos anos 60 e os homens famosos com quem ela dormiu. A diretora então resolveu contar essa fase desconhecida, focando nos três últimos anos de Nico, que faleceu em 1988, evocado no título.

O filme é um road movie, seguindo uma turnê europeia onde Nico interage com alguns personagens reais e outros inventados especificamente para o filme. Embora mostre um pouco da clássica representação de artistas se drogando e tendo chiliques no palco, o longa foca no lado humano da cantora: suas peculiaridades, seu olhar distante e voz monótona, e como ela se transforma no palco. Segundo alguns espectadores, a atriz Trine Dyrholm representa Nico nos shows com uma força e magnetismo que nunca sequer viram na Nico real. Uma cena em especial, num show em Praga, é onde Trine brilha mais, hipnotizando completamente a plateia (tanto a do filme, quanto a do show).

A atriz também canta de verdade nas cenas de performance, ao invés de apenas dublar as canções originais gravadas. O som era a maior preocupação de Susanna no filme e Trine emula com bastante precisão a voz de Nico, apesar de não se parecer tanto com ela fisicamente. Há também um evidente cuidado e carinho com a trilha sonora. Além das músicas ao vivo que são mostradas na íntegra, há várias cenas de transição com canções em off, também cantadas por Trine e embaladas por uma bela fotografia. Destaque para a bela e delicada cena da canção “Nibelungen”, a capella. O som do filme também é muito bem captado e tratado, chegando cristalino aos ouvidos da plateia.

Nico
Susanna Nicchiarelli e a atriz Trine Dyrholm.
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Foi muito importante a consciência de Susanna em recontar a fase esquecida de Nico, onde ela havia se reinventado, e sem a sombra de sua época mítica dos anos 60 atrelada a homens famosos. A diretora representa sua protagonista como autossuficiente e com controle de sua trajetória. Apesar dos vícios e outros problemas que enfrentou, o filme não a retrata como decadente, escolhendo, ao contrário, enfatizar os aspectos mais mundanos de sua vida – justamente os que a humanizam. É reconfortante encontrar uma biografia tão bem feita sobre uma mulher e dirigida por uma mulher. Precisamos de mais filmes assim.

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Cineasta, musicista e apaixonada por astronomia. Formada em Audiovisual, faz de tudo um pouco no cinema, mas sua paixão é direção de atores.
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