[SÉRIES] Samantha! – A sociedade do espetáculo e a busca da fama sem limites

[SÉRIES] Samantha! – A sociedade do espetáculo e a busca da fama sem limites

A nostalgia dos anos 80 está com tudo e não está prosa, e vem rendendo bons frutos para Netflix. De Stranger Things a Full House, não existe limite para essa onda de produções que retorna aos anos 80, seja para fazer uma referência ao rico universo pop da época ou para construir uma sátira as bizarrices do período.

No mês de junho estreou na Netflix sua primeira comédia nacional, protagonizada pela carismática Emanuele Araújo. A produção, de forma sátira e com ar nostálgico, conta a história de uma ex-estrela infantil dos anos 80 e sua busca pela fama e reconhecimento. Produzida por Alice Braga e Chuck Lorre (o mesmo produtor de The Big Bang Theory), Samantha! é uma série cheia de originalidade, bem no estilo made in Brasil, e capaz de produzir boas risadas para o público.

Samantha
Imagem: Netflix (Divulgação)

A sociedade do espetáculo

Por trás de toda essa nostalgia é importante ressaltar que existe um mercado que percebeu que as crianças dos anos 80 cresceram, e que hoje são adultos consumidores. Tirando o excessivo uso de fanservice, as produções que buscam retornar com esse ar oitentista estão mostrando muita competência em suas narrativas. Em Samantha!, o caso não é diferente. A série está cheia de boas intenções e provoca boas risadas, mas peca por lidar com assuntos complexos e sociais de uma forma extremamente superficial.

Devemos ter em mente que Samantha! é uma sátira que usa e abusa do politicamente incorreto para provocar risadas. Isso não é necessariamente ruim, mas a falha da série ocorre quando tenta ir por um caminho de crítica social sem de fato conseguir desenvolver o tema, atropelando o assunto com um alívio cômico, além de logo depois partir para outra piada temática que não é desenvolvida. Portanto, Samantha! acaba dependendo dessas micro-esquetes humorísticas e isso atrapalha o andamento da trama principal em alguns episódios.

Mesmo com esses problemas, a série possui um timing cômico bem sagaz. Samantha! reflete sobre o papel da mulher nesse sistema de busca sem medida por fama e reconhecimento, principalmente através da filha da protagonista. Ela é apresentada como uma jovem vegana e feminista, que tenta de várias formas construir um discurso de libertação feminina, mas que quando se vê dentro de um programa de jovens cantores acaba sucumbindo-se ao sistema.

No quarto episódio vemos também a inserção da trama de uma social influence, representada por uma jovem de moral duvidosa chamada Laila (Lorena Comparato), que usa o seu corpo numa banheira para ganhar likes, além de sempre escolher hashtags engajadas, entretanto, vazias de conteúdo. A trama faz uma crítica ácida sobre as novas formas da busca por 15 minutos de fama sem o ativismo explícito, além de colocar o dedo na ferida no destaque do corpo das mulheres como trampolim da busca pela fama.

Samantha
Imagem: Netflix (Divulgação)
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Um outro problema da produção são as atuações robóticas e os diálogos muitas vezes rasos e forçados. Emanuele Araújo acaba ficando muito destacada do resto do elenco, que entrega um resultado aquém do esperado. Os três primeiros episódios não foram introduzidos da melhor forma, mas a partir do episódio que foca em uma sátira aos programas de talentos infantis, a série ganha outro rumo e o elenco demonstra mais segurança em suas atuações. 

Quem viveu no período áureo dos programas infantis dos anos oitenta tende a se identificar mais com a narrativa do que os jovens da nova geração. Além disso, as piadas bairristas e as participações especiais são voltadas em construir essa relação de memória da protagonista com o seu passado de sucesso.

A primeira comédia nacional da Netflix é bem brasileira, e talvez isso atrapalhe um pouco o seu sucesso internacional, mas tem algo global na história de Samantha! Essa busca desenfreada por sucesso, que topa todo tipo de humilhação por mais uns 15 minutos de fama, é algo universal e conhecido pelo grande público. Com apenas sete curtos episódios, de 30 minutos de duração, a série é um prato cheio para uma maratona de um dia. Com algumas falhas que são bem passivas de resolver, Samantha! mostrou que a Netflix está no caminho certo da escolha de produções locais. Com uma 2ª temporada já confirmada, Samantha! mostrou que o Brasil tem muito o que oferecer a Netflix.

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Graduada em Ciências Sociais. Cineasta amadora. Viciada em livros, séries e K-dramas. Mediadora do Leia Mulheres de Niterói (RJ).
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