CRÍTICA | The Handmaid’s Tale – 3×07: Under His Eye

CRÍTICA | The Handmaid’s Tale – 3×07: Under His Eye

Entrando, então, em sua metade final, “The Handmaid’s Tale, série produzida pelo canal Hulu e baseada no livro homônimo de Margaret Atwood, chega ao seu sétimo episódio, intitulado Under His Eye. Entre pontos altos e baixos, a terceira temporada da série tem focado mais no posicionamento político de Gilead, mas também foca em seu revide à resistência e oposição de modo geral e contraria, desse modo, o que se esperava da temporada inicialmente.

[AVISO: CONTÉM SPOILERS]

Serena e a ilusão dos privilégios em “The Handmaid’s Tale”

serena joy e fred waterford
Serena Joy (Yvonne Strahovski) e Fred Waterford (Joseph Fiennes) (Foto: reprodução)

A tentativa de repatriamento de Nichole continua. June (Elisabeth Moss), contudo, já não parece mais necessária aos interesses imediatos de Serena (Yvonne Strahovski) e Fred Waterford (Joseph Fiennes). O que se evidencia, na verdade, sobretudo na relação entre Serena e June, é um distanciamento decorrente dos conflitos de interesses e é interessante observar que essa dinâmica reflete também em um conflito verificado na realidade.

Dentro dos movimentos feministas (os quais não são homogêneos), existe também uma parcela de defensores que acreditam que é suficiente dar voz às mulheres, sem questionar as origens da misoginia ou as diferentes facetas dessas violências estruturas; ou seja, do mesmo modo que Serena, se unem a um movimento de resistência ou revolta até o limite de seus interesses individuais, porquanto integram camadas mais elitizadas, cujos privilégios mascaram a opressão a que estão submetidas, e na ilusão de um poder, não saem de sua zona de conforto e contribuem apenas na medida do que lhes retornará em mais poder também em frente a outras mulheres – mas não plenamente na sociedade.

Serena, então, rompe com a proposta de resistência de June quando é preciso sacrificar seus desejos individuais. Ignora, todavia, tudo o que foi sacrificado, inclusive forçadamente – por vontade alheia ou pelas circunstâncias – pelas outras mulheres de Gilead. June certamente preferiria estar com suas duas filhas em vez de deixar Nichole partir com Emily (Alexis Bledel). Serena, no entanto, prefere se entregar ao conforto de uma situação “mais privilegiada” e renunciar aos seus atos anteriores.

Em  Under His Eye, as duas personagens não voltam, contudo, a interagir. Serena ainda vive, em “The Handmaid’s Tale, um momento de deslumbramento com as novas possibilidades que se delineiam, como reatar com Fred, mudar de distrito e ter uma filha.

June e a busca por Hannah

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June (Elisabeth Moss) (Foto: reprodução)

No quarto episódio de “The Handmaid’s Tale, God Bless The Child, Serena deu à June informações sobre Hannah (Jordana Blake). Desse modo, June poderia manejar formas de encontrar eventualmente sua filha mais velha. Passado, então, o alvoroço pelas notícias sobre Nichole, uma vez que retorna à sua vida cotidiana como Ofjoseph, June pode buscar meios de encontrar Hannah.

Há, contudo, um empecilho: June precisa convencer Eleanor Lawrence (Julie Dretzin) a fazer uma trajetória improvável para encontrar sua  filha e acaba, assim, descobrindo mais do passado do comandante Joseph Lawrence (Bradley Whitford). Descobre, por exemplo, que ele e Eleanor tentaram ter filhos durante algum tempo, sem sucesso. Isto ainda não explica, no entanto, as atitudes do comandante ou porquê ele se recusa a ter filhos através das aias, embora mantenha uma em casa e apoie o sistema.

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Embora comece com uma mentira, June consegue o apoio de Eleanor para ver sua filha e ainda que não possa conversar com ela, saber da proximidade ou de sua localização, vê-la de longe é suficiente. O que June não esperava é que estaria sendo vigiada pelas próprias aias.

“The Handmaid’s Tale” e a fé na violência

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June (Elisabeth Moss) e Eleanor (Julie Dretzin) (Foto: reprodução)

Um dos maiores problemas de toda opressão social é a estratégia de convencimento do oprimido de que a opressão que ele sofre é parte de um bem maior. Ou seja, o oprimido se torna um aliado por não compreender sua situação diante das formas de manipulação aliadas à violência. Por si só, isto constitui também uma violência. E não está fora de “The Handmaid’s Tale

Desde o início da terceira temporada, uma nova aia tem incomodado June e gerado algumas dúvidas. Ofmatthew (Ashleigh LaThrop) surgiu como a nova acompanhante de June, mas uma aia convencida de seu papel em Gilead. Em alguns episódios deu a entender alguns descontentamentos com o sistema, sobretudo quando descobriu que estava grávida novamente. O descontentamento, então, reaparece sob a confissão do desejo de nunca ter engravidado. Contudo, tudo parece ter sido uma estratégia para manipular a própria June.

Depois de ver June e Eleanor conversando com a martha que trabalhava para a família de Hannah, Ofmatthew a denuncia às autoridades de Gilead. Afirma, então, estava protegendo June. A martha é, assim, executada, e Hannah se muda da região. Quando June descobre o que Ofmatthew fez e que a estava vigiando a pedido de Tia Lydia (Ann Dowd), tem um episódio de raiva que, provavelmente, repercutirá mais tarde.

Os crimes necessários à sobrevivência

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Ofmatthew (Ashleigh LaThrop) (Foto: reprodução)

No Canadá, Emily enfrenta, enfim, as consequências de suas reações a Gilead. Diferentemente de June, ela carrega um histórico de ações impulsivas. Por exemplo: o furto de um automóvel, a tentativa de atropelamento e o esfaqueamento de Tia Lydia. Ainda que tenham sido reações à violência por ele enfrentada, são fatos utilizados contra ela diante do pedido de repatriamento de Nichole. Afinal, como provar que ela realmente não sequestrou a criança quando há um histórico descontextualizado e montado?

É preciso refletir, então, sobre o que define a “culpa” dentro dos sistemas de violência institucionalizada. Deveria Emily ter respeitado regras que a agrediam? E o que dizer, então, das aias obrigadas a executar suas iguais? Porque a novas estratégias em GIlead é que as aias puxem as cordas que enforcam os ditos criminosos. Sendo assim, são essas aias coniventes com um sistema, na medida em que exercem a tarefa, ou são, contudo, mais uma vez vítimas de um processo de violência, enquanto obrigadas a matar seus iguais sob o risco de serem as próximas. 

Por fim, até onde vai a ética em “The Handmaid’s Talee na vida real? Tribunais como o de Nuremberg julgaram já executores de sistemas totalitários e tiveram de considerar problemas semelhantes, entre a prática de uma conduta “recriminável” e a obediência à autoridade. São casos extremos, mas também casos comuns. Afinal, até onde a própria sociedade aceita algo sob a justificativa de que não há escolha – e até onde, de fato, não há?


Edição realizada por Gabriela Prado.

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Mestra em Teoria e História do Direito e redatora de conteúdo jurídico. Escritora de gaveta. Feminista. Sarcástica por natureza. Crítica por educação. Amante de livros, filmes, séries e tudo o que possa ser convertido em uma grande análise e reflexão.
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